Estruturas patrimoniais continuam sendo úteis, mas exigem mais atenção à coerência entre o contrato social e a prática da empresa
O uso de holdings familiares como ferramenta para organização patrimonial, sucessão planejada e gestão de bens se consolidou nos últimos anos. No entanto, o que muitos empresários ainda tratam como uma simples formalidade vem exigindo cada vez mais cuidado, especialmente no que diz respeito à qualidade do contrato social e à consistência das informações declaradas.
“É muito comum encontrar holdings criadas com base em modelos prontos, com cláusulas vagas ou mal adaptadas à realidade daquela família. E isso pode se tornar um problema quando as informações da empresa não conversam com o que está nos registros oficiais”, explica a advogada Thaís Mesquita, que atua com Direito Tributário e Planejamento Patrimonial.
Thaís observa que a análise dessas estruturas pelas autoridades fiscais se tornou mais técnica e precisa. Com o avanço da digitalização contábil e o cruzamento automático de dados, os órgãos de fiscalização têm mais facilidade para identificar inconsistências, como distribuição de lucros sem lastro contábil, ausência de movimentação financeira, contratos contraditórios ou transferências patrimoniais que levantam dúvidas quanto à sua natureza.
Na prática, a fiscalização passou a considerar não apenas o que está formalmente registrado, mas também a realidade econômica e operacional da empresa. E quando o contrato social não reflete com clareza essa estrutura, os questionamentos aparecem.
Um dos pontos mais sensíveis é o uso da holding para transferir bens, como imóveis, sem o devido recolhimento do ITCMD, o imposto estadual sobre doações e heranças. Situações como essa, se não bem justificadas e documentadas, podem ser interpretadas como tentativa de disfarçar doações. Além disso, é cada vez mais comum a revisão de casos em que não há movimentação ou registros compatíveis com a proposta empresarial declarada, algo que enfraquece a legitimidade da estrutura.
Thaís explica que o contrato social deixou de ser uma etapa meramente protocolar. “Hoje, ele precisa ser coerente com a realidade econômica da empresa, definir claramente os papéis de cada sócio, os critérios de administração e as regras para distribuição de lucros. Se esse documento não for sólido, ele compromete toda a segurança jurídica da estrutura.”
Outro cuidado importante está na integração entre os diversos documentos da empresa. Escriturações contábeis, declarações fiscais, alterações societárias e registros patrimoniais precisam estar em sintonia. Quando há desencontro entre essas informações, aumentam os riscos de questionamentos e autuações.

Revisar o contrato social, alinhar a documentação e garantir que a estrutura da holding faça sentido dentro da realidade da família deixou de ser uma recomendação e se tornou uma necessidade. Embora a holding continue sendo uma ferramenta eficaz e válida, ela exige atenção, planejamento e acompanhamento jurídico.